quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Em 40 anos, a biodiversidade marinha do planeta foi reduzida à metade

Populações marinhas foram reduzidas em 49% nos últimos 40 anos
© naturepl.com / David Fleetham


Populações de peixes importantíssimas para a segurança alimentar da humanidade estão em declínio no mundo inteiro, e sob risco de colapso total, de acordo com um novo estudo divulgado pela Rede WWF hoje. OLiving Blue Planet Report (“Relatório Planeta Azul Vivo”, em tradução livre) mostra que muitas das atividades que ameaçam os oceanos podem ser evitadas e que existem soluções para resolver este problema. 

A mais recente versão do estudo de mamíferos marinhos, aves, répteis e peixes mostra que essas populações foram reduzidas à metade nas últimas quatro décadas, com algumas populações de peixes disponíveis para consumo apresentando declínio de até 75%. As informações dão conta de que este é um problema de todas as nações do mundo, com destaque especial para os países em desenvolvimento. 

Para reverter este quadro de declínio, os líderes globais devem garantir que a recuperação dos oceanos e dos habitats costeiros seja um assunto-chave na discussão sobre a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS) das Nações Unidas, que serão formalmente aprovados no final deste mês. As negociações para um novo acordo climático global também são importantes oportunidades para “forçar” acordos e consensos no auxílio à saúde dos oceanos.

Prejuízo

“Nós publicamos este estudo com urgência para trazer a mais atualizada fotografia do estado dos oceanos”, disse o diretor-geral do WWF Internacional, Marco Lambertini. “No espaço de uma única geração, a atividade humana prejudicou seriamente os oceanos, pescando mais rapidamente do que a velocidade de reprodução dos peixes, ao mesmo tempo em que destruímos seus berçários. Precisamos de mudanças profundas para garantir vida oceânica abundante para as futuras gerações”. 

O relatório do WWF indica que espécies essenciais para a pesca comercial e de subsistência – e, consequentemente, para o suprimento de comida do planeta - estão sofrendo declínios acentuados. Além da severa queda nos estoques de peixes comerciais, o relatório detalha a dramática perda de 74% de indivíduos nos estoques de peixes que incluem atuns, cavalas e bonitos. 

“Nós estamos numa ‘corrida para pegar peixes’ que pode acabar com pessoas famintas, sem uma fonte de alimento vital, impactando uma engrenagem econômica muito importante. A sobrepesca, a destruição dos habitats marinhos e as mudanças climáticas terão consequências para toda a população humana, sendo que as comunidades mais pobres serão as mais afetadas. O colapso dos ecossistemas oceânicos seria o estopim de um declínio econômico seríssimo – e enfraqueceria a nossa luta para erradicar a pobreza e a desnutrição”, disse Lambertini. 

O relatório mostra o declínio de 49% das populações marinhas entre 1970 e 2012. A análise monitorou 5.829 populações de 1.234 espécies, fazendo com que o conjunto de dados seja quase duas vezes maior que o de estudos anteriores e trazendo uma fotografia mais clara e precisa da saúde dos oceanos.  

Os resultados são baseados no Living Planet Index, uma base de dados mantida e analisada pelos pesquisadores da Sociedade de Zoologia de Londres (ZSL, no original em inglês). Numa espécie de “resposta” às estatísticas alarmantes do Living Planet Report, publicado pela Rede WWF em 2014, este estudo analisa como a sobrepesca, os danos aos habitats marinhos e as mudanças climáticas estão afetando a biodiversidade marinha.

Corais, manguezais e algas

As mudanças climáticas é uma das ameaças à integridade dos ecossistemas marinhos, assim como a poluição, a sobrepesca e a destruição de habitats
© © naturepl.com / David Fleetham

Somando-se à crise da queda de populações de peixes, o resultado mostra também uma queda abrupta em recifes de corais, manguezais e algas marinhas, que ajudam na manutenção de populações de peixes. Mais de um terço dos peixes monitorados pelo relatório dependem de recifes de corais – que apresentaram um declínio perigoso de 34% em suas populações entre 1970 e 2010. 

O relatório mostra ainda que os recifes de corais podem ser considerados extintos por volta de 2050 devido às mudanças climáticas. Com mais de 25% de todas as espécies marinhas vivendo nos recifes de corais e cerca de 850 milhões de pessoas se beneficiando diretamente de seus serviços econômicos, sociais e culturais, a perda dos recifes de corais seria uma extinção catastrófica, com consequências dramáticas para a humanidade.

“O oceano é uma parte integral de nossas vidas. Nós estamos vivos por conta do ar puro, da água e de outros serviços que ele oferece. Mais que isso, nós estamos cercados pelo oceano e sua vida selvagem; e podemos perceber isso seja numa viagem para o litoral, visitando um aquário ou um zoológico. Este estudo sugere que bilhões de animais foram varridos dos oceanos durante a minha vida. É um terrível e perigoso legado para deixar para os nossos netos”, disse o Diretor de Ciências da ZSL, Ken Norris.

Mudanças climáticas

Enquanto a exploração predatória é identificada como a maior ameaça para a biodiversidade do oceano, o estudo mostra que as mudanças climáticas estão causando mudanças mais rápidas que em qualquer outro período em milhões de anos. O aumento das temperaturas e do nível de acidez dos oceanos, causado pelo dióxido de carbono emitido na atmosfera, agravam os impactos negativos da sobrepesca e de outros problemas, como a degradação dos habitats e a poluição.

Além do óbvio dano à natureza, as pressões aos oceanos põem em risco uma economia global de U$ 2,5 trilhões, além de arriscar uma base de ativos globais de pelo menos U$ 24 trilhões, de acordo com um estudo anterior da Rede WWF.

Segundo o relatório, as decisões tomadas na Conferência do Clima de Paris vão impactar diretamente o futuro da saúde dos oceanos. Os compromissos internacionais assumidos até agora não foram capazes de interromper o aumento dos níveis de aquecimento e acidificação que estão se mostrando catastróficos para os ecossistemas oceânicos e todas as pessoas que dependem deles. 

“A boa noticia é que as soluções existem e nós sabemos o que precisa ser feito. O oceano é um recurso renovável que pode estar disponível às futuras gerações se lidarmos hoje com as pressões ambientais de maneira adequada”, disse Lambertini. “Se vivermos dentro de limites sustentáveis, o oceano vai contribuir com a segurança alimentar, a economia e os nossos sistemas naturais. A equação é simples. Nós devemos pegar essa oportunidade de ajudar os oceanos e reverter os danos enquanto podemos”. 

Possíveis soluções

Living Blue Planet Report detalha ainda as oportunidades existentes para que governos, empresas e comunidades garantam um oceano vivo e saudável. Medidas importantes para a conservação dos recursos oceânicos incluem a priorização da sustentabilidade, conservação e recuperação de capital marinho e consumo mais inteligente e responsável.  

Este ano, um estudo do WWF atestou que cada dólar investido na criação de áreas protegidas marinhas pode render o triplo na forma de benefícios – por conta de fatores como empregos, proteção de litorais e produção pesqueira. Essa análise mostrou que o crescimento da proteção de habitats críticos poderia resultar em benefícios que podem variar entre U$ 490 e U$ 920 milhões acumulados no período 2015-2050. 

Em setembro, os governantes assinarão a Agenda de Desenvolvimento Sustentável para 2030 – cujas prioridades incluem a redução da pobreza e o aumento da segurança alimentar, temas que tem ligação direta com a saúde dos oceanos. É essencial que a implementação política e financeira da agenda de desenvolvimento sustentável traga resoluções sobre destruição de habitats, sobrepesca, pesca ilegal e poluição marinha.  

No Brasil

Em junho deste ano, no Dia Mundial dos Oceanos, o WWF-Brasil lançou seu Programa Marinho. A iniciativa contribuirá inicialmente para a compreensão e o atendimento dos impactos de três áreas: sobrepesca, turismo e poluição. O trabalho será desenvolvido a partir de quatro estratégias: gestão da qualidade de destinos costeiros; valorização da pesca sustentável; e fortalecimento e expansão das unidades de conservação (UC’s).

Com 10,8 mil km de extensão, a costa brasileira percorre 395 cidades, em 17 estados. Uma imensidão azul que abriga ¼ da população brasileira em um ecossistema único com 3 mil km de recifes de corais e 12% dos manguezais do mundo. É também um habitat com alta relevância econômica para o Brasil, tendo no turismo, na pesca e na exploração mineral seus principais alicerces, mas também com grande potencial biotecnológico e energético. 

“Vivemos um momento crítico na conservação dos recursos marinhos do Brasil, que sofrem com a pesca excessiva, fraca fiscalização, poluição, exploração mineral, necessidade de políticas públicas adequadas para o bioma, além da forte especulação imobiliária e consequente ocupação desordenada das cidades costeiras. Nossa atuação nos mares brasileiros visa chamar a atenção da sociedade para essa triste realidade, a importância da saúde dos oceanos para nossas vidas e como podemos nos mobilizar para protegê-los”, explica a coordenadora do Programa Marinho e Mata Atlântica, Anna Carolina Lobo.

Apesar dos recentes avanços de sua conservação no País, menos de 2% de toda essa biodiversidade está protegida. Preocupado com a situação e motivado pela necessidade de mudança, o WWF-Brasil está ampliando sua atuação para o bioma Marinho. Com ampla atuação em biomas como Amazônia, Cerrado, Pantanal e Mata Atlântica, a conservação da vida marinha fortalece e amplia as atividades da organização na proteção do meio ambiente em diferentes frentes.

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